O Brasil é um país campeão em desigualdades. Dados do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) revelam que dos 22 milhões de brasileiros que vivem abaixo da linha de pobreza, 70% são negros; entre os 53 milhões de pobres do país, 63% são negros. Estudo realizado pelos sociólogos Rosângela e Walter Praxedes, com base na Pesquisa Nacional de Amostras por Domicílio do IBGE, mostra que entre 1992 e 1999, a taxa de analfabetismo teve redução em todos os grupos de cor, mas “entre negros e pardos ainda são quase três vezes maiores do que entre brancos”. Em 1992, 10,6% dos brancos eram analfabetos, 28,7% dos pretos (nomenclatura oficial do IBGE) e 25,2% dos pardos. Em 1999, 8,3% dos brancos, 21% dos pretos e 19,6% dos pardos eram analfabetos.
Atualmente 95% de nossas crianças em idade escolar estão matriculadas no ensino fundamental. No entanto, este significativo avanço de inclusão de alunos matriculados na escola básica não vem acompanhado com a melhora da qualidade do ensino. Pelo contrário, os baixos salários, a não qualificação continuada do corpo docente, as péssimas condições de trabalho e de estudo e a falta de uma política educacional por parte do Estado brasileiro, são fatores desestimulantes ao processo de ensino/aprendizagem que o país necessita. Com isso há uma brutal evasão escolar.
Tanto que apenas 9% dos jovens entre 18 e 24 anos conseguem chegar à universidade, percentagem preocupante se compararmos com outros países da América Latina. Dos alunos matriculados no ensino superior apenas 2% estão estudando em uma instituição pública, o que torna o sistema ainda mais excludente.
Estudos do professor José Jorge de Carvalho, do Departamento de Antropologia da UNB, demonstra um outro lado desta exclusão perversa: 97% dos atuais universitários brasileiros são brancos, contra 2% de negros e 1% de amarelos. O desequilíbrio, num país em que 45% da população é negra, deixa claro que são necessárias medidas urgentes para inserção do negro no ensino superior.
E o que a universidade brasileira tem feito para isso. Muito pouco. Ela tem silenciado diante da tragédia que se abateu sobre o ensino básico público desse país, como também não tem lutado a contento para que as universidades públicas possam expandir e absorver a grande demanda social por vagas.
Neste sistema de exclusão, quem mais perde é o país. Imaginem quantos cientistas, quantos filósofos, quantos historiadores, quantos educadores, quantos médicos ou outros profissionais da saúde que poderiam estar contribuindo com o futuro do Brasil, mas ficaram excluídos em um rincão qualquer do interior ou nos bairros populares das médias e grandes cidades. Ou nós invertemos o foco e giramos nossas lentes para qualificar o ensino fundamental e médio, ou estaremos relegando a esse país um futuro infeliz.
A questão das cotas é uma luz que se coloca neste cenário. E penso que nós avançamos mais ainda quando deslocamos a questão das cotas do viés racial, para o debate das cotas para escola pública, porque incorpora uma dimensão social importante. Sabemos, porém, que as cotas não resolvem o problema. Pois uma universidade que recebe apenas 9% dos alunos em condições de estudar nela, sempre será uma universidade de elite, com cotas ou sem cotas.
O que precisamos é a expansão do sistema, o aumento do número de vagas, ou mais ainda: acabar com o perverso sistema de ingresso chamado vestibular. Como diz o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Aloisio Teixeira: “enquanto existir o vestibular, vai haver uma barreira intransponível para o povo entrar na universidade”.
É evidente que acabar com o vestibular requer conceber um novo sistema de ensino, rediscutir as relações entre o ensino superior e os níveis fundamental e médio, criando critérios para que os egressos desse níveis possam entrar na universidade independente da sua condição social. Daí que o debate sobre as cotas, seja ela racial ou social, deve ser encarada como uma medida paliativa e temporária, pois a verdadeira inclusão educacional somente virá com a adoção de políticas públicas voltadas para salvar o ensino fundamental e médio e ampla expansão de vagas públicas e gratuitas no ensino superior para os nossos jovens.
As políticas de ação afirmativa vêm sendo implementadas, com sucesso em diversos países. A Índia, após tornar-se independente em 1947, adotou um sistema baseado em cotas, o qual destinou, aos chamados “intocáveis”, cerca de 22,5% das vagas na administração e no ensino públicos. Essa medida tinha como objetivo a correção das desigualdades advindas do sistema de castas e da subordinação da chamada “origem divina”. Na Malásia a etnia bimiputra recebeu tratamento etnicamente diferenciado, com o objetivo de que fosse promovido seu desenvolvimento econômico. Entre 1982 e 1996, aproximadamente 25 países adotaram, de acordo com dados fornecidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), intervenções políticas visando a eliminar as discriminações sexual e racial ou implementado mecanismos de discriminação positiva nas relações de trabalho. Nos anos noventa, países como Ilhas Fiji, Malásia, Canadá, Índia e Austrália adotaram políticas de ação afirmativa no combate às desigualdades culturais. Na Europa, é possível encontrá-las, aplicadas às desigualdades de gênero.
No Brasil, o debate sobre cotas também não é novo. Haja vista a determinação de que 30% das vagas para eleições proporcionais sejam ocupadas por mulheres; que o serviço público deva empregar pelo menos 5% de funcionários portadores de deficiências; ou que sejam reservados lugares especiais para idosos em locais e transportes públicos.
Sabemos que o sistema de cotas para negros nas universidades gera polêmica e divide opiniões. Há vários argumentos contra e a favor. Tanta incerteza, no entanto, tem um ponto positivo: a reserva de vagas gera um debate importante sobre o racismo no Brasil, um país onde o preconceito existe, ainda que de forma velada.
Por isso a necessidade do debate. Não precisamos ter medo dessa discussão. Dispamo-nos de nossos preconceitos e aportemos a esse debate a nossa contribuição.
Atualmente 95% de nossas crianças em idade escolar estão matriculadas no ensino fundamental. No entanto, este significativo avanço de inclusão de alunos matriculados na escola básica não vem acompanhado com a melhora da qualidade do ensino. Pelo contrário, os baixos salários, a não qualificação continuada do corpo docente, as péssimas condições de trabalho e de estudo e a falta de uma política educacional por parte do Estado brasileiro, são fatores desestimulantes ao processo de ensino/aprendizagem que o país necessita. Com isso há uma brutal evasão escolar.
Tanto que apenas 9% dos jovens entre 18 e 24 anos conseguem chegar à universidade, percentagem preocupante se compararmos com outros países da América Latina. Dos alunos matriculados no ensino superior apenas 2% estão estudando em uma instituição pública, o que torna o sistema ainda mais excludente.
Estudos do professor José Jorge de Carvalho, do Departamento de Antropologia da UNB, demonstra um outro lado desta exclusão perversa: 97% dos atuais universitários brasileiros são brancos, contra 2% de negros e 1% de amarelos. O desequilíbrio, num país em que 45% da população é negra, deixa claro que são necessárias medidas urgentes para inserção do negro no ensino superior.
E o que a universidade brasileira tem feito para isso. Muito pouco. Ela tem silenciado diante da tragédia que se abateu sobre o ensino básico público desse país, como também não tem lutado a contento para que as universidades públicas possam expandir e absorver a grande demanda social por vagas.
Neste sistema de exclusão, quem mais perde é o país. Imaginem quantos cientistas, quantos filósofos, quantos historiadores, quantos educadores, quantos médicos ou outros profissionais da saúde que poderiam estar contribuindo com o futuro do Brasil, mas ficaram excluídos em um rincão qualquer do interior ou nos bairros populares das médias e grandes cidades. Ou nós invertemos o foco e giramos nossas lentes para qualificar o ensino fundamental e médio, ou estaremos relegando a esse país um futuro infeliz.
A questão das cotas é uma luz que se coloca neste cenário. E penso que nós avançamos mais ainda quando deslocamos a questão das cotas do viés racial, para o debate das cotas para escola pública, porque incorpora uma dimensão social importante. Sabemos, porém, que as cotas não resolvem o problema. Pois uma universidade que recebe apenas 9% dos alunos em condições de estudar nela, sempre será uma universidade de elite, com cotas ou sem cotas.
O que precisamos é a expansão do sistema, o aumento do número de vagas, ou mais ainda: acabar com o perverso sistema de ingresso chamado vestibular. Como diz o reitor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Aloisio Teixeira: “enquanto existir o vestibular, vai haver uma barreira intransponível para o povo entrar na universidade”.
É evidente que acabar com o vestibular requer conceber um novo sistema de ensino, rediscutir as relações entre o ensino superior e os níveis fundamental e médio, criando critérios para que os egressos desse níveis possam entrar na universidade independente da sua condição social. Daí que o debate sobre as cotas, seja ela racial ou social, deve ser encarada como uma medida paliativa e temporária, pois a verdadeira inclusão educacional somente virá com a adoção de políticas públicas voltadas para salvar o ensino fundamental e médio e ampla expansão de vagas públicas e gratuitas no ensino superior para os nossos jovens.
As políticas de ação afirmativa vêm sendo implementadas, com sucesso em diversos países. A Índia, após tornar-se independente em 1947, adotou um sistema baseado em cotas, o qual destinou, aos chamados “intocáveis”, cerca de 22,5% das vagas na administração e no ensino públicos. Essa medida tinha como objetivo a correção das desigualdades advindas do sistema de castas e da subordinação da chamada “origem divina”. Na Malásia a etnia bimiputra recebeu tratamento etnicamente diferenciado, com o objetivo de que fosse promovido seu desenvolvimento econômico. Entre 1982 e 1996, aproximadamente 25 países adotaram, de acordo com dados fornecidos pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), intervenções políticas visando a eliminar as discriminações sexual e racial ou implementado mecanismos de discriminação positiva nas relações de trabalho. Nos anos noventa, países como Ilhas Fiji, Malásia, Canadá, Índia e Austrália adotaram políticas de ação afirmativa no combate às desigualdades culturais. Na Europa, é possível encontrá-las, aplicadas às desigualdades de gênero.
No Brasil, o debate sobre cotas também não é novo. Haja vista a determinação de que 30% das vagas para eleições proporcionais sejam ocupadas por mulheres; que o serviço público deva empregar pelo menos 5% de funcionários portadores de deficiências; ou que sejam reservados lugares especiais para idosos em locais e transportes públicos.
Sabemos que o sistema de cotas para negros nas universidades gera polêmica e divide opiniões. Há vários argumentos contra e a favor. Tanta incerteza, no entanto, tem um ponto positivo: a reserva de vagas gera um debate importante sobre o racismo no Brasil, um país onde o preconceito existe, ainda que de forma velada.
Por isso a necessidade do debate. Não precisamos ter medo dessa discussão. Dispamo-nos de nossos preconceitos e aportemos a esse debate a nossa contribuição.
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